Sabemos que a advocacia, por sua natureza combativa e complexa, exige de nós não apenas conhecimento técnico, mas também postura ética e equilíbrio emocional. Ainda assim, mesmo os profissionais mais diligentes podem, em algum momento, enfrentar um processo ético-disciplinar junto à Ordem dos Advogados do Brasil. Quando isso acontece, a sensação de injustiça, exposição e insegurança é inevitável. Se você está passando por uma infração disciplinar, saiba que há caminhos legítimos para sua defesa — e um deles é a petição de recurso ao Conselho Seccional da OAB, instrumento previsto no Estatuto da Advocacia e que pode ser decisivo para reverter sanções injustas ou indevidas.
Neste artigo, compartilho orientações claras sobre o que configura infração disciplinar e como se defender com base no que prevê a legislação da Ordem, sempre com o devido respeito às garantias do contraditório e da ampla defesa.
O que é considerado infração disciplinar pela OAB?
A Lei nº 8.906/94, que rege o Estatuto da Advocacia e da OAB, elenca em seu artigo 34 as condutas que caracterizam infrações disciplinares. Entre as mais comuns, estão:
- Praticar ato incompatível com a advocacia;
- Descumprimento de prazos processuais de forma reiterada;
- Recebimento de valores sem prestação de contas ao cliente;
- Patrocinar causas com interesses conflitantes;
- Utilização de meios ilícitos para influenciar julgamentos;
- Violar, sem justa causa, sigilo profissional;
- Prejudicar, por culpa grave, interesse confiado ao seu patrocínio, entre outros tipos de infrações disciplinares.
Contudo, nem sempre a realidade do processo reflete a intenção do advogado. Em muitos casos, erros administrativos, interpretações equivocadas ou mesmo conflitos com colegas de profissão podem resultar em representação disciplinar. Por isso, é fundamental entender que o processo na OAB admite defesa técnica e possibilidade de revisão da decisão.
Trâmites do processo ético disciplinar
O processo ético disciplinar da OAB mantém os seguintes trâmites:
Na 1ª instância:
- 1º. Representação
- 2º. Petição Esclarecimentos preliminares
- 3º. Despacho instaurando a representação
- 4º. Petição de Defesa prévia
- 5º. Audiência de Instrução
- 6º. Parecer preliminar emitido pelo TED
- 7º. Petição de Razões finais
- 8º. Sessão de julgamento
- 9º. Sustentação oral
- 10º. Decisão do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB.
Na 2ª instância:
- 1º. Recurso contra decisão do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB para o Conselho Seccional da OAB
- 2º. Sessão de julgamento
- 3º. Sustentação oral
- 4º. Decisão do Conselho Seccional da OAB
- 5º. *Observação: Nos estados da Bahia e de Minas Gerais, é possível recorrer ao Órgão Especial da OAB contra decisões do Conselho Seccional. Somente após essa etapa, é cabível recurso ao Conselho Federal. Já nos demais estados, o recurso é interposto diretamente ao Conselho Federal da OAB.
Na 3ª instância:
- 1º. Recurso contra decisão do Conselho Seccional da OAB para uma das Turmas da 2ª Câmara do Conselho Federal da OAB
- 2º. Sessão de julgamento
- 3º. Sustentação oral
- 4º. Decisão por uma das Turmas da 2ª Câmara do Conselho Seccional da OAB
- 5º. Recurso contra decisão de uma das Turmas da 2ª Câmara do Conselho Federal da OAB para o Pleno da Segunda Câmara do Conselho Federal da OAB
- 6º. Sessão de julgamento
- 7º. Sustentação oral
- 8º. Decisão do Pleno da 2ª Câmara do Conselho Federal da OAB
Guia prático de recurso no processo disciplinar da OAB
1. Como funciona a defesa em instância seccional?
Se você foi intimado de uma condenação após processo disciplinar no Tribunal de Ética e Disciplina da sua seccional, o próximo passo é a petição de recurso ao Conselho Seccional da OAB. Esse recurso precisa ser fundamentado e protocolado dentro do prazo legal (15 dias após a ciência da decisão), observando os termos previstos no Provimento 146/2011 do CFOAB.
Essa etapa é essencial para garantir que o seu caso seja reavaliado por uma instância superior dentro da mesma seccional, o que aumenta as chances de revisão da penalidade, especialmente quando houver vícios processuais ou decisões desproporcionais.
2. Como recorrer para o Conselho Federal da OAB
Caso o Conselho Seccional da OAB mantenha a decisão que você considera injusta, ainda é possível interpor recurso ao Conselho Federal da OAB, instância máxima da entidade.
Esse recurso deve ser endereçado à instância federal por meio da própria seccional, seguindo os requisitos específicos do Regimento Interno do Conselho Federal. Ele funciona como um verdadeiro “recurso de apelação”, podendo revisar não apenas a legalidade, mas também o mérito da decisão anterior.
Mais do que um trâmite formal, esse processo representa o exercício pleno da advocacia — a nossa própria defesa diante de um cenário muitas vezes carregado de subjetividade.
Embargos de Declaração – Atenção, advogado!
Os embargos de declaração devem ser utilizados apenas para corrigir ambiguidade, obscuridade, contradição, omissão ou erro material no acórdão, não servindo para rediscutir o mérito da decisão. A OAB, especialmente o Conselho Federal, tem rejeitado embargos com caráter meramente protelatório, com base no art. 138, §3º, do Regulamento Geral do EAOAB, negando liminarmente seu seguimento.
Além disso, conforme o §5º do mesmo artigo, não cabe recurso contra essa negativa, e a reiteração desse tipo de expediente pode levar ao trânsito em julgado da decisão e baixa imediata dos autos (ex: Recurso n. 21.0000.2023.000195-8/SCA-PTU).
O Conselho também tem reafirmado que novos embargos contra acórdãos que já rejeitaram embargos anteriores são considerados protelatórios. Nesses casos, não os conhece e determina à Secretaria da OAB a certificação do trânsito em julgado (ex: Recurso n. 49.0000.2018.012321-4/OEP).
Como evitar que a infração disciplinar aconteça?
A melhor defesa ainda é a prevenção. Para isso:
- Mantenha seus arquivos organizados e com registros de todas as comunicações com os clientes;
- Atue sempre com zelo, ainda que o cliente insista em condutas questionáveis;
- Estude constantemente o Código de Ética da OAB;
- Quando em dúvida, consulte com antecedência a Comissão de Ética da sua seccional;
- Jamais aceite causas com interesses que possam conflitar, mesmo que em aparência.
Por fim, vale lembrar: defender-se de forma técnica e fundamentada é um direito seu. O processo disciplinar, mesmo que incômodo, pode ser enfrentado com dignidade e firmeza, especialmente com apoio profissional adequado!
Por Pedro Rafael de Moura Meireles, advogado especialista em processo ético disciplinar da OAB.